30/11/08

Ricardo Gonçalves*

Contradições comunistas

Para o PCP, Barak Obama não merece sequer o benefício da dúvida e o sistema em vigor nos Estado Unidos está longe se ser totalmente democrático
Na última tertúlia, em que participo há vários anos, o tema em destaque foi a eleição de Barak Obama para a presidência dos Estados Unidos. Como é habitual, para a conversa foram convidados elementos externos e, desta vez, a escolha recaiu na “Renovação Comunista”, organização que esteve representada por Cipriano Justo e Paulo Fidalgo.
No decorrer da conversa, os “renovadores” manifestaram todo o seu entusiasmo pela eleição de Obama e frisaram o seu apoio ao homem que fez sonhar novamente o povo americano.
A posição da “Renovação Comunista” surpreendeu-me, sobretudo porque é substancialmente diferente da que é sustentada pelo PCP e mostra como são diferentes os caminhos seguidos pelas duas facções após a queda do muro de Berlim. Enquanto os “renovadores” evoluíram nas suas posições, os comunistas continuam presos a utopias do passado.
Para o PCP, Barak Obama não merece sequer o benefício da dúvida e o sistema em vigor nos Estados Unidos está longe se ser totalmente democrático. Os comunistas continuam determinados em privilegiar uma contestação permanente ao poder e não se preocupam com possíveis alternativas, nem em interagir com aqueles que representam a esperança, como é o caso de Obama.
Curiosamente, os jovens deputados comunistas acabam por ser ainda mais fundamentalistas que os mais velhos. Como não tiveram dúvidas existenciais sobre o comunismo após a queda do muro, os jovens do PCP que vão entrado para a Assembleia da República acabam por ser muito menos abertos a qualquer mudança.
Assim, e ao contrário do que seria previsível, o rejuvenescimento da bancada do PCP representa a vitória dos ortodoxos e o afastamento dos reformadores.
Para o PCP actual, o comunismo nunca foi uma realidade pois o que se viveu na URSS foi apenas uma aproximação. Estes, em vez de meditarem nos erros do passado, continuam em busca de uma utopia que represente uma alternativa radical ao capitalismo e ao sistema liberal, garantindo que essa ilusória via é que vai funcionar. Para eles, o importante é continuar com a forte ilusão dos “amanhãs que cantam”.
O mesmo não se passa quando é necessário apresentar soluções viáveis e exequíveis para o dia-a-dia das pessoas. Os dirigentes do PCP ignoram a realidade e, por outro lado, não hesitam em acusar de “desistentes cobardes” todos os que abandonam este caminho do nada para procurarem verdadeiras soluções para as dificuldades que surgem nos dias de hoje.
Agarrado a utopias inalcançáveis e impraticáveis, o PCP (tal como o Bloco de Esquerda) garante a sua sobrevivência graças ao aproveitamento dos votos de protesto contra o poder instalado. Os comunistas não estão dispostos a contribuir com propostas capazes de ajudar a governar Portugal, limitam-se a viver à margem e a tirar partido dessa situação.
A posição da “Renovação Comunista” tem sido bem diferente. Os “renovadores” têm sido capazes de defender propostas realistas e integram-se com facilidade em diversos movimentos cívicos e sociais.
Apesar de tudo, também há aqui uma contradição. É que os “renovadores” dizem ainda ser comunistas e, sendo assim, como é que podem acreditar, e participar, num sistema político liberal e numa economia de mercado?

*Deputado do PS

Sem comentários: