14/09/09

SÓCRATES GANHA A MANUELA



O debate de sábado passado, entre José Sócrates e Manuela Ferreira Leite foi claramente ganho por SÓcrates.
Aliás, Sócrates ganhou TAMBÉM os debates televisivos com Portas, Louçã e Jerónimo.


Filipe Luís: "Nem um voto mudou"

Só mesmo estes dois me podiam interromper o jantar da vindima: arroz de feijão com um coelhinho grelhado, tinto da colheita anterior, a boa maçã de Alcobaça. Olhemos para o écrã, a ver se vale a pena...

(Escrevo este comentário na província, sem canais do cabo e sem ouvir outros comentários. Penso, porém, que a frase de Sócrates "se ganhar as eleições, formo UM NOVO GOVERNO COM NOVOS MINISTROS", dita en passant, e passando quase despercebida, é o facto político desta campanha. Aceitam-se apostas para a constituição do hipotético novo Governo socialista)

Os comentários que os leitores do nosso site VISÃO farão em baixo, dirão tudo: o vencedor do debate foi aquele com que simpatizam mais. Não haverá meio termo nem distanciamento possível. A crispação entre PS e PSD e, sobretudo, entre as respectivas lideranças, não permite leituras desapaixonadas. O veredicto do comentador será atacado, de qualquer maneira. O árbitro é sempre o culpado. E no entanto...

Outra vez uma analogia futebolística

E, no entanto, a exibição das duas equipas foi, senão fraca, calculista e para não perder. Utilizei imagens do futebol no debate Sócrates-Louçã e, desculpem lá, tenho de me socorrer, de novo, do mesmo truque. Prometo que não abuso. Só uma frase: este tão aguardado debate foi como a final do campeonato da Europa entre a República Checa e a Alemanha em que, depois de um jogo táctico muito chato, a coisa se decidiu num penalti. Neste caso, nem sequer houve um penalti. Foi um desafio de zero a zero, em que as defesas se superiorizaram aos ataques. Ainda outra analogia que serve às mil maravilhas em partidos tão clubísticos como o PS e o PSD: quando a nossa equipa perde, não mudamos para o adversário. Mesmo que um deles tenha perdido, o que é que isso interessa?...

Afinal, quem ganhou?

Se me perguntassem, diria que teria ganho José Sócrates. Mas foi uma vitória de Pirro, ou seja, sem efeito nenhum. Teve melhor postura, irritou-se menos, irritou menos o espectador neutro, foi - imaginem! - menos arrogante, explicou melhor os seus pontos de vista. Manuela Ferreira Leite foi mais trapalhona - não consegue explicar-se bem - foi exageradamente severa, não conseguiu esclarecer aparentes contradições. Nenhum esteve grande coisa: Sócrates foi como um Citroen Saxo artilhado: montes de papéis, gráficos, recortes, tudo previsto para dar 220 naquela auto-estrada (não sei se repararam...) da mesa do debate. Manuela foi uma Ford Transit pastelona, mas pesada, a amolgar o chassi do adversário sempre que o encostava à berma. Ou seja: Sócrates fez o que se esperava dele - mas não mais do que isso. E Manuela aguentou-se nas curvas. Se Sócrates ganhou, não lhe serve de nada: não foi o suficiente para conquistar um único voto ao PSD. E, aí, Manuela, mesmo que tenha perdido, ganhou: porque o adversário vem de uma derrota eleitoral e está na mó de baixo. Ele é que tinha de acelerar. Mais: há um ano o PS era dado como aspirante a uma maioria absoluta. Assim, se Sócrates não lhe conseguir roubar eleitores, Sócrates perderá...

Alguns flashes

Sócrates desmonta bem a história da qualidade da democracia e da asfixia democrática.

Manuela apresenta a história de vida - e académica, uma boca ao diploma de Sócrates - como garante da credibilidade.

Sócrates ataca os arguidos candidatos a deputados.

Manuela contra-ataca como os duplos candidatos - casos de Ana Gomes e Elisa Ferreira, candidatas às europeias e às autárquicas.

Sócrates replica com o caso Jardim, falso candidato ao Parlamento nacional.

Manuela diz que não abre excepções a falar de casos na Justiça - alusão ao caso Freeport, "não me puxem pela língua"...

Sócrates volta à credibilidade e diz que a política faz-se com humildade e não com arrogância - fantástico...

Manuela é eficaz na descrição da crise de responsabilidade socialista.

Sócrates usa a mesma táctica que usou contra Louçã e começa a descascar o programa do PSD: SCUT's, Serviço Nacional de Saúde, Segurança Social...

Manuela defende-se melhor do que Louçã mas, apesar de dizer que não é ela que está a ser julgada, passa boa parte do debate a justificar-se e a justificar as suas propostas.

Sócrates defende bem o TGV, mas Manuela empata, atacando bem o TGV.

Sócrates fala no Pagamento Especial por Conta - invenção de Manuela - e ela fala-lhe de Paulo Macedo, o eficaz director-geral dos Impostos a quem o PS também tanto deve - também "inventado" por ela.

Sócrates é bom a puxar pelos galões da política social e a atacar o pessimismo da adversária, ela diz que o optimismo também não cria empregos.

Manuela ataca com a demagogia do papão de Espanha, Sócrates contra-ataca com a demagogia do papão privatizador do PSD, no Estado Social.

O discurso de Sócrates é mais compreensível, claro, terra-a-terra, o de Manuela mais hermético, para iniciados.

Sócrates está mais descontraído, nada intimidado, Manuela Faz o seu número de preceptora castigadora do menino mal comportado, e não lhe mostra os dentes. O que não é bom: um sorriso, nas câmaras, não se destina ao adversário, mas aos eleitores. Ninguém a instruiu sobre isso?

Ah, não esqueçamos: Manuela deixou de dizer "piquenas" para corrigir para "pequenas" e médias empresas. Quem ganha o debate é Ricardo Araújo Pereira (o primeiro humorista a apanhar a expressão "piquenas").

Conclusão? Mas qual conclusão?

Desculpem lá: futebol outra vez. Quando uma equipa de que não se espera muito conquista um ponto no Estádio da Luz, os comentadores dizem que jogou melhor do que o Benfica. Manuela Ferreira Leite conquistou um ponto no terreno do adversário - a televisão. O que não é "piquena" coisa.

José Carlos de Vasconcelos: "'Vitória' claríssima de Sócrates" De todos os debates televisivos, este foi o mais claramente desigual na prestação dos dois líderes partidários frente-a-frente. E creio que um mínimo de objectividade obriga a reconhecer, por maior que seja a simpatia face a Manuela Ferreira Leite (MFL), que o seu "vencedor" claríssimo foi José Sócrates. Se se tratasse de um combate de boxe - que felizmente não era, e nem no aspecto metafórico felizmente chegou a ser, não obstante a vivacidade, por vezes agreste, que o caracterizou -, se se tratasse de um combate de boxe, dizia, não teria sido sequer uma vitória os pontos, no fim de todos os "assaltos", antes por KO, lá pelo meio do tempo "regulamentar". Aí talvez pela história das Scuts...

De facto, após a pergunta inicial da moderadora, para Sócrates, em que falou de professores, Freeport, etc., causando ao líder do PS um embaraço ou uma irritação que dificilmente "disfarçou" (e se tivesse começado por protestar sobre o seu teor, como me pareceu lhe apetecia, ou lhe respondesse agastado, isso ter-lhe-ia sido muito negativo), a pergunta inicial, para MFL, sobre a Madeira, e os dois candidatos do PSD acusados em processos-crime, deixou-a logo em posição difícil. Porque é uma matéria em que não tem defesa possível e além disso Sócrates, quanto à Madeira, acrescentou algo de que não estaria à espera e a que não foi capaz de ensaiar sequer um esboço de resposta, a não ser que sempre tem sido assim...

Refiro-me ao facto de JS ter lembrado que MFL fala de uma "política de verdade" e, ainda no caso da Madeira, tem uma candidato "falso", pois o n.º 1 da lista é Alberto João Jardim que toda a gente sabe, e ele próprio afirma, não assumirá o mandato. Depois, quase pior a emenda que o soneto, a líder do PSD disse que então também ali havia um "candidato" falso, permitindo a interpretação de que o que não ganhasse não iria para deputado; de tal forma que Sócrates disse que iria... e ela disse que também iria!

Mas, para lá das naturais divergências políticas em diversas matérias, foram múltiplas as incapacidades de resposta de MFL. E mesmo em alguns aspectos em que tinha possibilidade de ganhar pontos e esteve à beira de o conseguir, como no caso dos professores, a citação por Sócrates de anteriores declarações suas em sentido completamente contrário ao actual, destruíram-lhe tal possibilidade e deixaram-na numa situação muito incómoda, mesmo muito difícil - até por ser demasiado "débil" justificar sempre essas contradições ou mudanças de posição com a alteração das condições do país. Porque tais contradições ou mudanças não aconteceram só quanto aos professores como em relação ao TGV, ao IMI e ao PEC, à questão das privatizações, em particular na Saúde e na Educação, etc.

Enfim, pelo resumidamente exposto, pela citação não negada de números relativos ao seu Governo (nos aumentos do salário mínimo, apoios sociais, etc.) e àqueles a que MFL pertenceu, que lhe eram largamente favoráveis, digamos que pela própria atitude, o líder do PS venceu incontestável e nitidamente o debate, como já disse. E se no debate com Louçã a prestação da líder do PSD ultrapassou as expectativas, como aqui sublinhei, hoje ficou muito aquém delas.

Se o resultado das eleições dependesse deste debate, ou pelo menos este debate pudesse dar o contributo mais decisivo para esse resultado, como alguns defenderam, o PS tinha hoje ganho, e à distância, o sufrágio do próximo dia 27. Mas está por provar essa tese e que tais vitórias tenham necessariamente esse resultado. Mais, diz-nos a experiência que em alguns casos muita gente até emocionalmente acaba por se pôr do lado do mais fraco e que também pode conquistar votos quem num debate deste tipo vai praticamente às cordas...

SÓCRATES EM CASA

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