06/06/10

A vaca, o galo e Salazar









Por: João Duque, Professor Catedrático do ISEG


Contava-se que a mãe de António Oliveira Salazar, em profundos cuidados com a saúde de seu amado filho, teria prometido uma vaca à Senhora padroeira da terra caso o jovem António vencesse uma grave doença que o teria atacado.

Curado, mandou-o a mãe à Vila para vender a vaca com intuito de pagar a promessa à santa padroeira. Aproveitando a tarefa, pediu-lhe que vendesse um galo o qual, pela capoeira, criava mais desacatos que ovos galados. Pediu-lhe a mãe 100 escudos pela vaca para enfiar na caixa das esmolas da Santinha, e 1 escudo pelo galo para cómodos da família.

Na feira, António virou o negócio do avesso. A um fazendeiro abastado pediu o jovem António 1 escudo pela vaca. "- Ó garoto, tu sabes o que estás a pedir?" "Sei sim, meu senhor, 1 escudo pela vaca!" "- Então compro-te a vaca!" "-Sim senhor. Mas se levar a vaca tem de me comprar o galo..." "- E quanto queres tu pelo galo, ó petiz?" "- 100 escudos!" "- 100 escudos? Tu estás a mangar comigo? Mas assim como assim, como no cômpito geral o preço é justo, fico-te com ambos. Mas digo-te que nunca tinha feito um negócio tão estranho."

Alguns banqueiros parecem estar incomodados com a nova legislação que impõe a consolidação das operações de ‘cross selling' às operações de crédito imobiliário, quando os benefícios numas operações dependem da aceitação de outras operações firmadas com a mesma instituição e quando, até as garantias reais se estendem aos outros créditos concedidos. Baixam o ‘spread' do empréstimo se...

No entanto, quando um banco realiza um negócio que tem requisitos da mesma natureza faz os cálculos como agora se pretende obrigar a fazer e a publicitar.
Sou o primeiro a reconhecer e a testemunhar como o sistema bancário é dos bons exemplos na economia portuguesa: foram inovadores, são eficientes, são pólos de desenvolvimento de tecnologia e conhecimento, são empregadores de muita mão-de-obra e ainda são lucrativos! (Neste aspecto há quem ache mal, mas eu não!).

No entanto, como qualquer agente informado sabe, a análise de qualquer negócio deve fazer-se envolvendo todos os ‘cash-flows' marginais associados, e os que resultam de obrigações de ‘cross selling' de outros produtos, devem sempre ser considerados.

Logo, a exigência agora emergente da nova legislação é pertinente, porque vai obrigar a adequar o custo da operação à operação em si, tornando mais difíceis malabarismos que dificultam a comparação do ‘pricing'.

Todos estamos conscientes que as margens terão de se manter, mas para quê fazê-lo de modo pouco claro e à custa da assimetria de informação entre os agentes?

Ao saber o preço da vaca, a mãe de Salazar, desesperada, lança as mãos à cabeça e grita "- O que foste tu fazer António? Vender a vaca por um escudo?" "- Sim, minha mãe. Mas vendi-lhe o galo por 100! Agora dê à Santa o preço da vaca..."