29/10/08

Inferências

Distrito de Setúbal - Um Laboratório político para as forças de esquerda

Por António Sousa Pereira



“Promover a identidade cultural e económica de uma cidade ajuda se se conseguir vender a cidade como um bom sítio para viver e visitar, tornando-a num bom local para fazer turismo, mas também para localizar um negócio” – esta sugestão de politica urbana, referida, hoje, 15 de Outubro, no jornal “Público” por Rui Tavares, citando Paul Krugman, Nobel da Economia, fez-me pensar, de facto, sobre a realidade do Barreiro e do Distrito de Setúbal nos tempos de hoje e nos desafios que tem pela frente nas próximas décadas.

Não há homens providenciais. Não há homens deuses. Mas, há homens que, pelas circunstâncias históricas podem dar um contributo essencial, porque, pelas suas posturas e modos de estar na vida pública, são, eles mesmos, catalisadores de vontades e saberes.
Dou, apenas, dois exemplos que marcam as vivências quotidianas da vida política local ou regional - Vítor Ramalho e Carlos Humberto.


Na vida há uns homens que falam com o coração, escutamo-los e sentimos que as suas palavras emergem de valores e princípios que defendem, porque os consideram mais válidos, mais necessários, como contributo para o mundo que idealizam.
Podemos discordar. Podemos até ter opiniões contrárias, mas, sentimos que as suas “ideias” são uma “energia” motivadora e mobilizadora, que, muitas vezes, superam os campos de acção que, eles mesmos, delimitam para os seus projectos, ou para os projectos que estão envolvidos.
Talvez, por essa razão, estejam, nos tempos de hoje, actuais, as velhas discussões filosóficas sobre qual “o papel do indivíduo na história”, assim como a abordagem dos conceitos como “liberdade” e “igualdade”, que marcaram muitas gerações e ainda estão presentes nas discussões “ideológicas” do presente e, obviamente continuarão, porque, para mim, cada vez mais, acredito, que o “motor da história é a LIBERDADE”.

Um Laboratório político para as forças de esquerda

O distrito de Setúbal vai ser nos próximos tempos o grande laboratório nacional da esquerda portuguesa e, sem dúvida, a esquerda tem que ser capaz de demonstrar, aqui e agora, que faz da política uma causa ao serviço dos cidadãos, para a região e para o país.
Os desafios dos tempos que se aproximam exigem mais, muito mais, que a esquerda não seja protagonizada por uma espécie de “novo riquismo político-moralista”, feito muitas vezes de “superioridades morais” ( vindas de muitos lados, porque nisto não há exclusivos) antes pelo contrário, estes tempos, exigem que à esquerda exista capacidade de intervenção política com base em valores e ideologia, que se expressa nas concepções de cidade, cidadania, do papel do estado e do municipalismo, o sentido do bem comum, a defesa da liberdade e tolerância politica, promovendo, portanto, uma nova consciência social, moderna e humanista.
Por essa razão, aqueles que se assumem como protagonistas da vida política têm que ser os primeiros a dar sinais de que estão disponíveis para dar um sentido à história e encontrar respostas para os desafios que se colocam no desenvolvimento e no apontar soluções, que possam ser dinâmicas mobilizadoras dos agentes económicos e sociais, assim como, dos próprios cidadãos, na sua individualidade, de forma que estes assumam um papel activo.

O papel do indivíduo na história

Não há homens providenciais. Não há homens deuses. Mas, há homens que, pelas circunstâncias históricas podem dar um contributo essencial, porque, pelas suas posturas e modos de estar na vida pública, são, eles mesmos, catalisadores de vontades e saberes.
Dou, apenas, dois exemplos que marcam as vivências quotidianas da vida política local ou regional.
Por exemplo, na área do Partido Socialista, reconheço em Vítor Ramalho um político que tem uma visão global do distrito e, que, como político, considera ser necessário que os socialistas se assumam, com os seus ideais, com os seus valores, com responsabilidade activas, sendo cada militante ou activista do Partido Socialista, um exemplo de cidadania. Ele próprio procura dar essa dimensão da sua actividade política.
Vítor Ramalho sublinha, de forma permanente, a importância das ideias na concretização da acção política.
Por outro lado, na área do Partido Comunista Português, Carlos Humberto, presidente da Câmara Municipal do Barreiro e presidente da Junta Metropolitana de Lisboa, também reconheço como um político que sabe fazer da politica um espaço de construção, de abertura de portas ao diálogo, não abdicando dos seus valores, dos seus ideais, mas agindo com a consciência que a sua acção politica visa a construção de uma cidade e a valorização de uma região. Ele próprio assume uma postura de vivência da política como uma causa nobre, onde, de facto não vale tudo, colocando bem viva a faixa dos valores ideológicos.
Naturalmente, que ambos terão estratégias partidárias, naturalmente que ambos terão objectivos políticos de ordem partidária, de conquista do poder e de manutenção do poder.
Um político sem poder, no poder ou na oposição, não tem forma de lutar pelos seus ideais.
Certamente não será Vítor Ramalho que fará a realidade da intervenção política do partido Socialista na região, porque a acção de um partido é desenvolvida pelo trabalho dos seus militantes.
Certamente não será Carlos Humberto que determina a acção política do seu partido no concelho do Barreiro, pelas mesmas razões, porque um partido é feito da acção dos seus militantes.
Estes são dois exemplos de homens que sinto, são daqueles que falam com o coração, com ideias e com valores, contrariamente a muitos outros que, quando os escuto, sinto que falam com o estômago. É a lei da sobrevivência, que também, hoje, como ontem e sempre, motiva a vida.

“Bloco central” de esquerda no distrito de Setúbal

Referi os dois exemplos - Vítor Ramalho e Carlos Hunberto - com intencionalidade porque, de facto, são estes dois partidos o PS e o PCP/CDU, os principais protagonistas de poder e de oposição à esquerda no distrito de Setúbal.
Nenhum deles é Deus. Nenhum deles tem o dom de fazer milagres. São de facto isso, e apenas isso, referências epocais, fruto de circunstâncias e dos movimentos da história.
Na minha opinião, não são eles individualmente, mas sim, de facto, o PS e PCP/CDU que caracterizam o “bloco central” de esquerda no distrito de Setúbal, pelo protagonismo politico e pelo peso eleitoral que recebem dos cidadãos da região.

Bloco de Esquerda entre dois “ódios de estimação”

Sim, é verdade, também existe o Bloco de Esquerda, mas está numa fase embrionária de afirmação, vivendo numa situação de quem, no dia a dia, tem dois “ódios de estimação” ou “dois amores” depende da circunstância e dos factos – o PS a nível do Poder Central e o PCP/CDU ao nível do Poder Local.
O Bloco de Esquerda vive o drama de ter que conquistar a nível local espaço ao PCP/CDU e, também, simultaneamente, tentar desgastar o PS, com base nas críticas à sua acção governativa.
O Bloco de Esquerda tem que ser capaz de conquistar o seu espaço por si próprio, com os seus projectos, mas, o que acontece é que vai, muitas vezes, a reboque dos acontecimentos. Está, politicamente, num aperto constante entre duas forças que lhe são adversas.
Mas, por vezes, estrategicamente, parece que o “parceiro” preferencial” do Bloco de Esquerda é o PS, fazendo do PCP/CDU o seu inimigo principal. Percebe-se.
O Bloco de Esquerda tem que dar o salto de “grilo falante” para uma dimensão que consiga marcar as suas diferenças entre o PS e PCP/CDU, embora, percebo, é difícil e exige muita “ginástica”, tanto mais que o BE, pela sua natureza, por vezes, torna-se mais papista que o papa, no que diz respeito a “superioridade moral”.

A catarse dos bons e dos maus

Penso que na nossa região, existe um problema social por resolver, fruto de uma herança de muitas gerações.
O distrito de Setúbal foi, antes do 25 de Abril, uma referência para as forças de oposição ao regime deposto com o 25 de Abril.
Nós, em Portugal, vivemos muitos anos a pensar a “preto e branco” – de um lado os “fascistas”, de outro lado os “comunistas”, passamos pelo PREC, onde a ordem inverteu-se, chegámos ao Cavaquismo, onde, de novo, o país, retomou o “preto e branco”, nesta circunstância com o “estado laranja”.
Algo que é natural, num país que vive, desde a Monarquia Constitucional à sombra do estado, daí, a tal actualidade dos textos que por vezes circulam, escritos, de Eça de Queiroz.
António Guterres, com os “Estados Gerais” pareceu que tinha aberto uma nova fase, talvez o começo da “catarse” destas heranças, de vivermos de forma permanente com as “superioridades morais”.
Tudo de desmoronou no “lamaçal”.
Cá estamos de novo. E, nos tempos de hoje, penso que o grande desafio é sermos capazes de construir um país e uma região, com orgulho na sua história e memórias, e, portanto, afirmar o direito à diferença, porque foi por isso que o distrito de Setúbal, lutou antes do 25 de Abril. Uma luta pela LIBERDADE.
Estou cansado de olhar para o lado e ouvir sempre o velho discurso dos “bons” e dos “maus” que, a maior parte das vezes, não tem origem em ideias e valores, tem a sua génese no estômago.
Por isso é que admiro esse esforço dos políticos que falam com o coração, que vivem com o coração, que lutam com o coração, porque esse é o caminho para que sejamos capazes de fazer a catarse e acabar com os estigmas que marcaram muitas gerações.
Será que o poder e a luta pelo poder vai dar espaço a que isso aconteça?

Os mais papistas que o papa

Por vezes, nos dias de hoje, começo a ter medo que o Estado, que já foi fascista, já foi PREC, já foi laranja, se transforme num a aparelho rosa. E isso, então, dá origem a que os “discursos políticos” nasçam no estômago e que surjam, no aparelho, os mais “papistas que o papa”, em ideias, mas apenas porque o importante é manter o poder.
Isto acontece, sempre, quando as ideias e os valores são substituídos pelo imediatismo do salve-se quem poder.
O Distrito de Setúbal, com os desafios que tem pela frente, pode ser um exemplo para o país, vai ter que ser capaz de dar o seu contributo para esta viragem histórica, na construção de uma nova mentalidade social.
Os partidos de esquerda tem essa responsabilidade histórica, sobe pena de, ao falharem, deixar o caminho aberto, para, de uma vez por todas, as força de centro direita e de direita, assumirem, por direito próprio, a gestão dos destinos da região e do país, porque, de facto, a esquerda perderá a sua autoridade moral, e, perdendo a autoridade moral ( que ainda tem) perderá, a prazo, a autoridade politica.

Promover a identidade cultural e económica

“Promover a identidade cultural e económica de uma cidade ajuda se se conseguir vender a cidade como um bom sítio para viver e visitar, tornando-a num bom local para fazer turismo, mas também para localizar um negócio” – esta sugestão de politica urbana, referida, hoje, 15 de Outubro, no jornal “Público” por Rui Tavares, citando Paul Krugman, Nobel da Economia, fez-me pensar, de facto, sobre a realidade do Barreiro e do Distrito de Setúbal nos tempos de hoje e nos desafios que tem pela frente nas próximas décadas.
É uma reflexão que, de facto, exige-nos que pensemos, o que queremos para a nossa região, pensar sobre as suas imensas potencialidades adiadas durante décadas e que, agora, parece, finalmente, existir uma luz ao fundo do túnel.
Esta nova realidade do Distrito de Setúbal, vai colocar, sem dúvida, grandes desafios a todos os agentes da região. Não é hora de cruzar os braços, é hora de arregaçar as mangas e começar a caminhar para o futuro que está aí, na nossa frente, todos os dias.
Este é um distrito liderado, em todas as suas Câmaras Municipais por forças politicas de esquerda, uma realidade que vai exigir a todos os agentes políticos com responsabilidade que sejam capazes de para além dos interesses partidários imediatos que sejam salvaguardados os interesses locais e regionais, em prol da construção daquela que vai, certamente ser, por alargamento da AML, a região motor do país no século XXI.
Penso que estamos numa encruzilhada e, nos tempos de hoje, vencerá politicamente, quem for capaz de protagonizar a autoridade moral, afirmando valores e ideias, respeito e tolerância, por isso, deixei, para reflexão, dois exemplos – Vítor Ramalho e Carlos Humberto, nos seus cargos, opções políticas e como homens.

António Sousa Pereira