06/11/09




Por: Ondina Margo

Politicamente Correcto

Nos dias que correm, à falta de argumentos mais substantivos, é frequente ser-se acusado de: “politicamente correcto”. Quer com isso o acusador afirmar que o acusado, ironia das ironias, recorre a argumentos sem substância. Por outras palavras, quando se declara que alguém é politicamente correcto, porque, por exemplo, defende o casamento entre pessoas do mesmo sexo, está a dizer-se que os argumentos ou ideias que defende valem apenas pelo facto de aderirem, sem reflexão, aos estereótipos dominantes. Sendo que, estes estereótipos, são normalmente ideias vazias e sem sentido.

Antes de começar esta crónica tinha uma ideia acerca da origem e história da expressão “politicamente correcto” que, à medida que li algumas coisas, acabou por ser questionada. Pensava eu, ignorância das ignorâncias, que surgira nos anos noventa do século passado para se referir às tentativas americanas de normalização da linguagem, que acabaram em excessos ridículos. Na prática, verifiquei que está associada a esforços de controlo de linguagem, desde que, na primeira guerra mundial, o ministro de informação, de então, tentou certificar-se que se dizia apenas o que, e nos termos que, interessavam ao estado Britânico. Para não alongar muito esta crónica, refiro apenas outro dos usos, posteriores, da expressão. Ela está também associada ao regime soviético e depois chinês, de Mao Tse Tung, que queriam, mais uma vez, garantir uma ortodoxia de pensamento, logo de expressão, e por isso decidiam o quê, e como, devia ser dito.

Com esta, espero que não muito fastidiosa, digressão histórica, quis tentar pôr em perspectiva uma locução, que passou a ser usada com muita frequência e pouca reflexão. Quando alguém defende o direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo, levantam-se logo vozes em uníssono, afirmando a correcção política desta ideia, como se, por isso, fosse vazia e, portanto, não merecesse discussão. Assim, quando discordo dos argumentos de alguém, ou das ideias que defende, carimbo-as de “politicamente correctas” para não ter que as debater. E há uma palavra que define essa acção: censura. Ou seja, a expressão “politicamente correcto” é usada ainda hoje com o significado com que surgiu, como forma de censurar as palavras, logo as ideias, de alguém.

Ora, as ideias devem ser medidas por elas mesmas, depois de discutidas e analisadas, e não podem estar à mercê de rótulos, que censuram ou branqueiam a realidade. Por isso, ser homofóbico ou intolerante, não é ser politicamente incorrecto, é ser homofóbico e intolerante. E, defender a liberdade e o respeito pela diferença, não é ser politicamente correcto, é defender a liberdade e o respeito pela diferença. É que, entre tantos rótulos, às vezes tendemos a esquecê-lo. Se calhar, para que eu própria não o esquecesse, escrevi esta crónica.


Ondina Margo

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